Nova Iorque, 21 de março de 2016

Senhor Presidente do Conselho de Segurança,

Senhor Secretário-Geral das Nações Unidas,

Senhores Ministros,

Senhor Comissário da União Africana para a Paz e Segurança,

Senhor Enviado Especial do Secretário-Geral para a região dos Grandes Lagos,

Senhoras e Senhores Representantes Permanentes,

Minhas Senhoras e Meus Senhores,

É com grande satisfação que me dirijo, pela primeira vez, em nome de Portugal, ao Conselho de Segurança das Nações Unidas, nesta muito oportuna iniciativa da Presidência angolana.

A paz e segurança na região dos Grandes Lagos enfrentam grandes desafios, complexos, reconhecidos e assumidos pela liderança africana envolvida e empenhada na procura de soluções. Tem contado para isso com a solidariedade e o apoio da comunidade internacional. Disso mesmo é prova o debate que hoje nos reúne.

Gostaria de saudar os incansáveis esforços do Senhor Secretário-Geral, bem como do seu Enviado Especial para a Região dos Grandes Lagos de apoio à estabilidade, paz, segurança e desenvolvimento dos países da região. Nesse sentido, saúdo a apresentação do Quadro Estratégico das Nações Unidas para a Região dos Grandes Lagos 2016-2017 que apoiará, numa perspetiva de desenvolvimento, a implementação do Quadro de Paz, Segurança e Cooperação para a República Democrática do Congo (RDC) e para os países da região, assinado em 2013. Registo, com satisfação, o estabelecimento de um roteiro de prioridades do Enviado Especial do Secretário-Geral, bem como os seis pilares de ação selecionados, todos correspondendo a áreas que reconhecemos serem cruciais para responder adequadamente aos maiores desafios na região.

Portugal, a título nacional e enquanto Estado membro da União Europeia, tem contribuído e continuará a contribuir empenhadamente para que seja prestado um apoio firme e solidário aos esforços dos países da região dos Grandes Lagos nos seus processos de reconciliação nacional, de consolidação da democracia, de desenvolvimento económico e social sustentável e respeito pelos Direitos Humanos, de harmonia com as disposições do Acordo-Quadro de Adis Abeba de 2013.

Temos acompanhado, com particular atenção e preocupação, a situação no Burundi. Louvamos os esforços levados a cabo pela Comunidade da África Oriental, pela União Africana e pelas Nações Unidas, para a promoção de um diálogo inclusivo. Acreditamos que esse é o único caminho válido para evitar uma escalada do conflito e uma maior deterioração da situação de Direitos Humanos no país. Os Acordos de Arusha, ainda em vigor, são um modelo de referência de uma solução africana para um problema africano. Esperamos que, através do diálogo político abrangente e inclusivo, seja resolvido o atual conflito. Encaramos a chegada ao Burundi dos 200 observadores e peritos militares da União Africana como um passo importante no bom sentido.

Na República Democrática do Congo registaram-se progressos no plano da segurança mas têm sido lentos os progressos na implementação das Declarações de Nairobi. Mantém-se um clima de tensão e a continuada presença de grupos armados no país, em particular as ADF e as FDLR. Neste contexto, saudamos o recente acordo que viabiliza operações conjuntas das Forças Armadas da RDC e da MONUSCO contra as FDLR. Consideramos fundamental assegurar um forte apoio à missão das NU no terreno, MONUSCO, e promover o estreitamento da sua colaboração com as Forças Armadas da RDC, assim como o Diálogo Estratégico entre a ONU e o Governo da RDC sobre a estratégia de saída da MONUSCO que, na nossa opinião, deverá ser um processo gradual, à luz dos progressos obtidos.

Urge ainda assegurar a inclusividade e a representatividade do diálogo político nacional na República Democrática do Congo. Qualquer alteração do quadro constitucional que não reúna o necessário consenso político consubstancia um fator de risco para a estabilidade da RDC, com potenciais repercussões negativas em todo o continente. Apelamos às autoridades congolesas e de outros países da região para que ratifiquem e se empenhem efetivamente na implementação dos princípios da Carta Africana para a Democracia, Eleições e Governação. Portugal revê-se inteiramente na declaração de 16 de fevereiro, subscrita pelas Nações Unidas, União Europeia, União Africana e Organização da Francofonia e saúda a nomeação do Enviado Especial da União Africana.

Senhor Presidente,

As continuadas violações do Acordo de Cessar-Fogo e a dramática situação de Direitos Humanos no Sudão do Sul preocupam-nos seriamente. É urgente que todas as partes se empenhem no cumprimento integral do Acordo de Paz e que seja estabelecido o Governo Transitório ali previsto.

É também urgente garantir, em toda a região, que a ajuda humanitária chega a quem dela necessita. Apelo, por isso, à colaboração sem reservas dos Estados, para que criem as indispensáveis condições de acesso para que todos possamos contribuir para minorar o sofrimento de refugiados, de deslocados internos e de populações que carecem de assistência humanitária urgente.

Senhor Presidente,

África ocupa um lugar especial na política externa portuguesa.

Também constante é o empenho de Portugal no multilateralismo ativo, baseado na plena confiança no sistema das Nações Unidas, que consideramos primordial para a manutenção da paz e segurança internacionais e para a promoção de todos os pilares do desenvolvimento sustentável. Essa é a nossa motivação para que ao nível bilateral, no âmbito da União Europeia, da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e no seio das Nações Unidas, sejamos um parceiro presente, constante, atento e solidário. Esse é o rumo que prosseguiremos, no pleno respeito pela apropriação pelos Estados e reconhecimento da responsabilidade e vocação das organizações regionais.

  • Continuaremos a participar no esforço da Comunidade Internacional para promover e incentivar o diálogo com os países da região, designadamente através de organizações regionais e subregionais como a União Africana, a Conferência Internacional para a Região dos Grandes Lagos, a Comunidade da África Oriental e a Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral.
  • Promoveremos e apoiaremos ações de formação e sensibilização nas áreas da boa governança e da luta contra a corrupção, da distribuição equitativa de recursos, do empoderamento e dos direitos das mulheres e do direito à educação.
  • Prosseguiremos a cooperação para a reforma dos setores de segurança e judicial, numa perspetiva de capacitação. Saudamos, neste contexto, a ação da Missão de Aconselhamento Militar da União Europeia na República Centro Africana e a futura missão de treino militar.
  • Incentivaremos a participação do setor privado e da sociedade civil na implementação de projetos que promovam a paz e o desenvolvimento e, nesse contexto, saúdo a realização da Conferência Internacional sobre o Investimento Privado na Região dos Grandes Lagos, que recentemente teve lugar em Kinshasa.

Quero louvar todo o trabalho que Angola tem desenvolvido na Presidência da Conferência Internacional para a Região dos Grandes Lagos, na procura de soluções para conflitos e na identificação de caminhos para o desenvolvimento da Região.

Na região dos Grandes Lagos, a par de grandes desafios, existe também um vastíssimo potencial de desenvolvimento. O desenvolvimento integrado e sustentável, envolvendo desde logo a melhoria das condições de vida das populações, deverá envolver uma gestão economicamente viável, socialmente inclusiva e ambientalmente sustentável dos recursos naturais. Só a paz e a segurança criarão as condições básicas para o desenvolvimento; só a paz permitirá impedir a delapidação dos recursos naturais pelos “senhores da guerra” e facções rebeldes. Por outro lado, só uma boa governação e a existência de instituições sólidas facilitará que seja exigida e verificada a transparência na atuação das indústrias extrativas, a criação de cadeias de valor ligadas a essas indústrias e a definição e implementação de políticas que assegurem que o crescimento económico se traduzirá em desenvolvimento humano e que chegue efetivamente a todos os setores da população. O compromisso de todos é de que ninguém deve ser deixado para trás.

Estou ciente de que a generalização da cultura democrática requer estabilidade. Não me refiro, porém, a uma estabilidade política a qualquer preço, mas à estabilidade que deriva do rigor no cumprimento da ordem constitucional, do Estado de Direito, da transparência e fiabilidade dos processos eleitorais e de instituições estatais que protejam os interesses de toda a população.

A concluir, reafirmo a disponibilidade e o empenho de Portugal para colaborar com os países da região dos Grandes Lagos, desejando que o sonho de Nelson Mandela de uma África em paz consigo mesma seja uma realidade.

Muito obrigado.

Discurso de S. Exa. o Ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, Augusto Santos Silva, no debate aberto do Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre “Prevenção e resolução de conflitos na região dos Grandes Lagos” 

UN Photo/Manuel Elias

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