Nova Iorque, 27 de setembro de 2014

Senhor Presidente da Assembleia-Geral,
Senhor Secretário-Geral,
Distintos delegados,
Senhoras e senhores,

Senhor Presidente, começo por felicitá-lo. A sua eleição testemunha o forte compromisso de África para com as Nações Unidas e o multilateralismo. Dirijo, também, uma palavra de reconhecimento ao seu antecessor, Embaixador John Ashe, pela dedicação ao serviço desta Assembleia.

Ao Secretário-Geral reitero o meu agradecimento pela sua liderança desta Organização e pela sua ação incansável em prol da paz, num período tão difícil e tão complexo da vida internacional. Felicito-o, também, pela realização da Cimeira do Clima que permitiu renovar o apoio político ao objetivo de atingir, em 2015, um acordo climático justo, universal e juridicamente vinculativo. Portugal - e a União Europeia no seu conjunto - continuarão a trabalhar de forma incansável e inclusiva para que esse objetivo seja atingido.

Esta é a sessão da Assembleia-Geral à qual cabe o enorme desafio de atualizar os Objetivos do Milénio, tendo em vista a adoção, no próximo ano, da Agenda de Desenvolvimento pós-2015.

Pode contar, Senhor Presidente, neste e noutros processos, com o empenho e o apoio de Portugal nos trabalhos da Assembleia Geral, sede primeira do multilateralismo e legitimadora da ação coletiva internacional. O compromisso do meu país para com as Nações Unidas, a Carta e os princípios e valores que a orientam é firme, convicto e permanente.

Nesta sessão decorrerão as eleições para o Conselho de Direitos Humanos, para o mandato 2015-2017, a que Portugal se candidata. Esperamos contar com o apoio de todos. É com expectativa, mas também com esperança, que encaramos esse momento pois, se for eleito, Portugal será, pela primeira vez, membro de tão importante órgão.

No passado mês de abril, Portugal submeteu-se ao segundo Exame Periódico Universal do Conselho de Direitos Humanos. O registo nacional nesta matéria mereceu amplo reconhecimento. Para além de outros fora multilaterais, Portugal tem participado ativamente no Conselho de Direitos Humanos, onde apresenta anualmente resoluções sobre o direito à educação e sobre os direitos económicos, sociais e culturais.

Esperamos, no decurso do próximo mandato, ter a oportunidade de contribuir ainda mais significativamente, pois acreditamos na capacidade do Conselho para apoiar os Estados no cumprimento das suas obrigações em matéria de direitos humanos.

Apresentámos um conjunto significativo de “propostas e compromissos” que orientarão o exercício do nosso mandato, com o objetivo de promover e proteger o carácter universal, indivisível, inalienável e interdependente de todos os direitos humanos – civis, culturais, económicos, políticos e sociais.

Já provámos, durante o nosso último mandato enquanto membros do Conselho de Segurança, em 2011 e 2012, que valorizar e promover sistematicamente os direitos fundamentais é, para nós, uma prioridade.

Se eleito, Portugal exercerá o seu mandato convicto de que o sistema multilateral de proteção dos direitos humanos deve permanecer forte, independente e exigente. Portugal é, aliás, Parte, sem reservas, de oito dos tratados fundamentais de direitos humanos das Nações Unidas e de todos os respetivos protocolos adicionais.

Continuamos a assistir a acontecimentos que esperávamos já erradicados no século XXI - violações em larga escala de direitos humanos, privação de vastas populações da sua dignidade mais elementar e desrespeito de princípios basilares da convivência internacional, como a integridade territorial e a soberania dos Estados.

A Carta das Nações Unidas, hoje como há 69 anos, mantém-se atual. É nela – e nos seus generosos e ambiciosos princípios - que devemos fundamentar respostas justas, duradouras e conformes ao Direito Internacional para as crises que enfrentamos. A Carta põe à disposição dos Estados os mecanismos institucionais necessários. Mas o seu funcionamento e eficácia dependem da vontade política de todos os membros desta Organização.

Senhor Presidente,

Os grupos terroristas, extremistas e radicais merecem o nosso mais veemente repúdio e a nossa condenação. Constituem, em primeira instância, uma ameaça para os Estados e para as populações dos territórios em que estão presentes. Mas são, também, um risco para a paz, para a segurança e para a estabilidade regional e global. Esta ameaça exige respostas firmes e concertadas da Comunidade Internacional.
   
O auto-designado “ISIS” constitui, na atualidade, um exemplo sinistro daquele tipo de ação criminosa e bárbara. Deve ser combatido e neutralizado. A Cimeira do Conselho de Segurança e a correspondente resolução sobre o preocupante fenómeno dos “combatentes terroristas estrangeiros” representaram importantes passos nesse sentido.

A região do Médio-Oriente continua a exigir uma especial atenção. No Iraque, a desumanidade terrorista atinge populações indefesas e vitima principalmente mulheres e crianças, bem como minorias étnicas e religiosas.

A situação no Iraque não pode ser desligada do prolongado conflito na Síria, onde os níveis de violência e de sofrimento são, pela sua dimensão e duração, indescritíveis. Todas as partes devem assumir a responsabilidade de procurar uma transição política para uma sociedade democrática e pluralista.

Uma vez mais chegamos a esta Assembleia sem progressos no conflito israelo-palestiniano. As expectativas que aqui todos partilhámos há um ano, goraram-se. Os recorrentes ciclos viciosos de hostilidades têm de cessar. O conflito a que assistimos em Gaza este Verão não pode voltar a repetir-se. Aproveito para congratular o Egito pelo cessar-fogo, assim como para saudar os esforços de outros parceiros regionais e internacionais, incluindo os do Secretário-Geral das Nações Unidas e do Secretário de Estado Kerry.

Não haverá paz duradoura, nem estabilidade no Médio-Oriente, sem a resolução desta questão. Reitero o apoio do meu país a uma solução que, com base nas resoluções das Nações Unidas, consagre um Estado Palestiniano soberano, independente e viável, vivendo lado a lado com o Estado de Israel, cujas legitimas aspirações de segurança têm de ser garantidas.

Os sinais positivos quanto ao programa nuclear iraniano que, também há um ano, testemunhámos, viriam a ser confirmados no “Plano de Ação Conjunto” de Genebra. É agora necessário um novo impulso político. Portugal apoia e incentiva as negociações em curso com vista a um acordo abrangente.

Senhor Presidente,

Os acontecimentos de 2010 e 2011 no Norte de África tiveram um impacto político, económico e social sem precedentes. A consolidação das reformas políticas, o crescimento económico sustentável e a segurança são os maiores desafios que os países da região enfrentam.

Portugal exerce atualmente a co-presidência do “Fórum do Mediterrâneo Ocidental”, também conhecido como “iniciativa 5+5”, que congrega 10 países das margens norte e sul do Mediterrâneo. Queremos reforçar o contributo desta plataforma para a cooperação e a confiança recíproca entre os países que a integram.

A Líbia é um importante parceiro deste Fórum e é com muita preocupação que olhamos para a situação naquele país. A Comunidade Internacional deve apoiar o processo de transição política mas exige-se, sobretudo a todos os atores líbios, empenho num diálogo nacional genuíno e frutuoso.

Na Europa, a crise na Ucrânia e a anexação ilegal da Crimeia ressuscitaram tensões que julgávamos ultrapassadas. Congratulo-me com o cessar-fogo e apelo ao seu cumprimento integral. Encorajamos as partes a procurarem ativamente uma solução política que seja duradoura, num quadro que respeite a soberania, a integridade territorial, a unidade e a democracia da Ucrânia.

Senhor Presidente,

África é para nós um parceiro de referência. Os Estados africanos são nossos parceiros não só no plano político mas, também e cada vez mais, nos domínios do comércio e do investimento, com base em relações paritárias e benefícios recíprocos, incluindo a criação de emprego e o desenvolvimento económico.

Com total respeito pela apropriação africana, procuramos contribuir para os esforços internacionais, nomeadamente das Nações Unidas, que visam estabilizar situações de conflito ou prevenir riscos de segurança em África. Assim, Portugal participa atualmente na Missão Integrada das Nações Unidas no Mali (MINUSMA). Estamos, também, interessados em participar nos esforços multinacionais para reforço da segurança do Golfo da Guiné e disponíveis para cooperar no fortalecimento das capacidades marítimas dos países da região.

Nos últimos meses chegaram-nos boas notícias do país amigo e membro da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa – a República da Guiné-Bissau. A reposição da ordem constitucional, a realização de eleições livres e a tomada de posse de instituições democráticas legítimas, dois anos após o golpe de Estado de 2012, são uma nota de esperança e merecem, sem dúvida, ser saudadas.

As enormes dificuldades socioeconómicas e a recorrente e grave instabilidade que a Guiné-Bissau enfrenta há década e meia, não impediram o povo guineense de eleger os seus novos líderes em eleições livres, ordeiras e transparentes. Esta oportunidade de um efetivo “virar de página” tem de ser aproveitada e apoiada. O povo e as autoridades guineenses estão a fazer o seu papel. A consolidação dos avanços requer – e merece - o apoio da Comunidade Internacional.

Os parceiros internacionais podem e devem desempenhar um papel determinante em áreas como a capacitação técnica e a assistência financeira, apoiando as prioridades indicadas pela Guiné-Bissau. Para além disso, consideramos que uma força de estabilização baseada na ECOMIB, possivelmente alargada a novos parceiros africanos e mandatada pelas Nações Unidas, seria adequada. Saudamos, assim, as iniciativas que as Nações Unidas em conjunto, nomeadamente, com a União Africana, a CPLP, a CEDEAO e a União Europeia vêm promovendo em benefício da Guiné-Bissau.

Senhor Presidente,

Na Cimeira do Milénio, os Chefes de Estado e de Governo tomaram a decisão histórica e inspiradora de adotar os Objetivos de Desenvolvimento do Milénio. Temos, agora, a responsabilidade de acelerar a concretização daqueles objetivos e, simultaneamente, de preparar uma nova agenda de desenvolvimento. Portugal está fortemente empenhado na definição desta nova agenda.

Precisamos de uma nova “parceria mundial”, transformadora, que incorpore uma perspetiva transversal de direitos humanos e de combate às desigualdades. E que promova sociedades pacíficas, estáveis e justas, aprofundando a agenda da população e desenvolvimento.

Abordagem universal e responsabilidade partilhada são os conceitos chave. Mas a universalidade da agenda pós-2015 não pode ser sinónimo de insensibilidade às especificidades dos países menos avançados e mais vulneráveis como os pequenos Estados insulares em desenvolvimento.

Os novos desafios, como as alterações climáticas, os tráficos ilícitos, a pirataria e as pandemias são hoje ameaças de primeira grandeza.

O surto de Ébola em países da África Ocidental exige uma intensa conjugação de esforços da comunidade internacional para conter e debelar este flagelo. O meu país está já a participar neste urgente esforço global, concretamente na Guiné-Conacri, no quadro da operação das Nações Unidas.

Senhor Presidente,

Não obstante o trabalho dos seus antecessores, a reforma do Conselho de Segurança tarda em realizar-se. A posição do meu país sobre esta matéria é bem conhecida desta Assembleia. Independentemente das divergências que existem, não podemos desistir. Juntos teremos de encontrar uma solução que permita dotar o Conselho de Segurança de uma representatividade acrescida do mundo em que vivemos. A celebração dos 70 anos desta Organização é, também, uma oportunidade que deve ser aproveitada para concretizar a reforma do Conselho de Segurança.

Portugal, país cuja vocação marítima se materializa hoje numa nova Estratégia Nacional para o Mar, assente no “crescimento azul”, tem apoiado ativamente os esforços das Nações Unidas para uma gestão sustentável dos Oceanos e dos seus recursos. Copresidimos ao grupo de trabalho que prepara o primeiro Relatório Global do Ambiente Marinho e defendemos a adoção de um instrumento internacional, no quadro da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, relativo à conservação e utilização sustentável da biodiversidade marinha em áreas além da jurisdição nacional.

Portugal irá organizar, em junho de 2015, um grande evento internacional sobre o Mar – a “Semana Azul” – para debater os assuntos marítimos nas suas mais diversas dimensões e no qual esperamos contar com a presença de todos.

Senhor Presidente,

A língua portuguesa é o elo principal que une os Estados que compõem a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. É um veículo de comunicação global, na qual se exprimem cerca de 250 milhões de pessoas na sua vida quotidiana, no comércio e nos negócios, na cultura e nas redes sociais.

É, também, língua oficial ou de trabalho em várias organizações internacionais, nomeadamente em agências especializadas das Nações Unidas. Na CPLP temos como ambição e objetivo a adoção da língua portuguesa como língua oficial das Nações Unidas. A recente Cimeira de Díli, realizada em julho passado, confirmou a vitalidade e afirmação crescentes da CPLP. Foi, também, o momento em que Timor-Leste assumiu a Presidência, facto que confere uma nova dimensão e alcance à CPLP ao ter a sua presidência situada, pela primeira vez, no continente asiático.

Senhor Presidente,

Não posso deixar de assinalar que se celebrará, no próximo dia 20 de Novembro, o 25º aniversário da Convenção dos Direitos da Criança, instrumento de que Portugal é Parte sem reservas, assim como dos seus três Protocolos Facultativos. Aproveito esta ocasião para apelar a que todos ratifiquem esta Convenção e respetivos Protocolos.

No decurso desta 69ª sessão será submetido, de novo, o projeto de resolução sobre a moratória da pena de morte. Esperamos que possa merecer um significativo e crescente apoio dos membros desta Assembleia.

Se viermos a ser membros do Conselho de Direitos Humanos, como esperamos, pautaremos a nossa ação pelos princípios da cooperação e do diálogo. Trabalharemos com todos os Estados e demais intervenientes para construir pontes na aplicação plena das normas e padrões de direitos humanos.

Se merecermos a confiança desta Assembleia será um privilégio poder trabalhar, como membros do Conselho, com o novo Alto Comissário, o Príncipe Zeid Al-Hussein, a quem reitero o total apoio de Portugal. Aproveito, também, para expressar o reconhecimento do meu país à anterior Alta Comissária, Navi Pillay, pelo extraordinário trabalho desenvolvido, tantas vezes em circunstâncias especialmente difíceis.

Termino com uma evocação da Primeira Guerra Mundial, acontecimento trágico a que a Carta das Nações Unidas se refere logo no início, ao afirmar a determinação de “preservar as gerações vindouras do flagelo da guerra que, por duas vezes no espaço de uma vida humana, trouxe sofrimentos indizíveis à humanidade”.

Neste ano em que se assinala o centenário desse acontecimento e em que preparamos a comemoração do septuagésimo aniversário desta Organização, devemos ter presentes, de uma forma muito especial, aquelas palavras.

Podem contar, Senhor Presidente e Senhores delegados, com Portugal na prossecução dos princípios e dos objetivos da Carta em prol da paz, do desenvolvimento e do respeito por todos os direitos humanos.

Muito obrigado.

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